Escriba de Broalhos cronicando cenas no belogue sobre cultura audiovisual e artística

"A poesia é o que existe de mais parecido com a construção de um filme" Joana Figueiredo, realizadora

Mais Recente

“Citizen Kane”, por Orson Welles

Destaque para a exploração expressiva da profundidade de campo, possibilitado por avanços tecnológicos como a nova câmara, mais pequena e portátil, novos equipamentos de iluminação mais potentes e película com maior fotossensibilidade (Eastman Super XX).

É notável o uso inédito da Fotografia que Welles empregou no filme, introduzindo no cinema sonoro artifícios como planos muito angulares sobre a figura protagonista, contrapicados e picados, mitificando-a ou diminuindo-a. O uso de ângulos baixos destaca o protagonista, simultaneamente sugerindo clausura, solidão. A iluminação usa de grandes contrastes de claro-escuro – Grey Toland foi o director de fotografia.

A narrativa desenrola-se, e a crescente distância do protagonista ao mundo é explicitada pela progressivamente maior distância no enquadramento de outras personagens.

Na profundidade de campo, o espaço é por vezes distorcido, espelhando o estado psicológico do protagonista.

É recorrente o recurso a transições “fade” e “crossfade”.

O raccord sonoro não é limitado pela lógica narrativa, mas usado a par com a banda sonora num registo mais rico, na medida em que diálogos se sobrepõem  e encavalgam entre cenas diferentes – overlapping sound montage/montagem de sobreposição sonora.

A narrativa começa a desenvolver-se aquando da morte do protagonista, cuja vida será revivida cronologicamente através de analepses despontadas por conhecidos seus. No plano inicial de Xanadu, uma janela iluminada escurece – metáfora visual para a morte de Kane, que sussurra “Rosebud” antes de falecer, deixando cair um globo de neve (um símbolo diegético decifrado pela audiência posteriormente). Segue-se a sequência “News of the March”, reportagem da vida de Kane, que sumariamente apresenta a narrativa da vida deste, um personagem polémico, simultaneamente admirado e repudiado.

A narrativa efectiva do filme revolve em torno das cinco entrevistas/testemunhos que um jornalista reúne com o propósito de decifrar o significado da última palavra de Kane.

No final, revista a vida de Kane, os investigadores não têm sucesso, sendo mostrada no enquadramento a vastidão de bens terrenos que este colectara em vida, metaforicamente espelhando as peças do puzzle da sua mulher; partes constituintes de algo fútil. Um dos investigadores comenta algo como “uma palavra não é suficiente para definir a vida dum homem”; um comentário irónico para a audiência, que compreende a palavra “Rosebud” – esta traduz a infância de que Kane abdicou para seguir promessas de fortuna material, decisão que viria a ressentir.

A montagem é elíptica, na medida em que o último plano é o inicial, mostrando Xanadu.

Nouvelle Vague

Alexandre Astruc é o crítico de cinema que, no seu artigo de 1948, introduz o conceito de “camera-stylo”/“câmara-caneta”, por que o cinema se tomava por uma expressão tão flexível e subtil como a linguagem escrita. Esta sua proposição abriu caminho à noção do “realizador-autor”, o génio criativo motriz de cada aspecto artístico do filme, como antes não se pensava. Estas ideias libertam a expressão fílmica da mera tradução do argumento, para se tornar registo artístico subjectivo partindo do impulso criativo do realizador.

Astruc tomou parte dos que contribuiram para a revista “Cahiers du Cinema”, cujos nomes associados incluem Truffaut, Godard, Chabrol – os realizadores que impulsionaram o movimento “Nouvelle Vague”.

Este movimento criou uma apologia própria de rejeição à estética da montagem, à mera construção do filme como junção de imagens para pintar o argumento; isto em prol da estética da “mise-en-scène”, a exploração plástica de toda a encenação a ser gravada, através de expressivas profundidades de campo e planos-sequência.

Destes esforços de renovação estética, resultou a noção de um filme não se prender a uma experiência intelectual, mas igualmente emocional.

O movimento preocupou-se em validar a noção de Astruc do “autor”, por que o filme se torna um reflexo pessoal duma mundividência artística, longe do mero produto industrializado/massificado e impessoal para que evoluía o Cinema.

Neo-Impressionismo

Começado em França, no final do século XIX. Seus artistas incluem Seurat e Signac.

Consideravam que a pintura impressionista não respeita a aplicação rigorosa da Teoria da Cor, que na sua espontaniedade negligenciava a correcta exploração da Teoria.

Usam de uma técnica lenta e laboriosa da partição de tons – enquanto os impressionistas representavam as suas “impressões” imediatas, os neo-impressionistas sistematizavam-nas metodicamente.

Nascem as técnicas do Divisionismo e Pontilhismo, que usavam pontos de cores complementares, que não se misturavam efectivamente, para aludir à forma – concedeu-se primazia total à expressão da cor, numa construção rigorosa marcada por desenho severo mas expressivo.

Naturalismo e Realismo

Este é o século da Laicização do Pensamento, racional e pragmático.

Positivismo – primado da experiência empírica na construção do conhecimento

Cientismo – visão sobre a ciência como resposta messiânica aos desafios do Homem

A atitude que se impõe é o Racionalismo Positivista, teorizado por Comte e Kant, e por que só são tomadas por verdades científicas as que advêm da razão aliada à experiência – uma apologia do racionalismo e empirismo. Isto a par do Socialismo de Proudhon, que defendia um compromisso humanista de luta pela igualdade social, resposta aos emergentes problemas do proletariado.

No tumulto das revoluções científicas e filosóficas, a par das mudanças sociais e económicas, também a arte se projecta para um maior compromisso com a realidade objectiva. A desumanização e laicização da sociedade, consequências da industrialização e capitalismo que se instauraram

NATURALISMO

Corrente da 2ª metade do século XIX, por que a Arte devia representar objectivamente o visível quotidiano e natural. As temáticas e tratamento sentimental românticos são descartados.

Estes artistas levam o seu trabalho para o exterior dos estúdios e a proximidade ao referente natural impele os artistas a atentarem a pormenores de luz, tom, texturas. Privilegiava-se a representação paisagista.

A Escola de Barbizon é a iniciadora do movimento; compromete-se a pintar a Natureza como esta se apresenta. Nesta aldeia francesa, os artistas se viraram directamente para a Natureza, fugindo à agitação urbana e rigor académico para aqui explorarem uma expressão naturalista e se libertarem do fantástico, religioso ou histórico.

Rousseau, Daubigny e Corot, Boudin e Whistler são dos mais emblemáticos artistas desta corrente.

REALISMO

Corrente estética (pictórica e literária) que se afirmava como anti-académica, surgida em França, entre 1848 e 70, encontrando inspiração no mundo coevo, na realidade e contexto social concretos – sua preocupação máxima era a tradução objectiva da realidade. Trata-se de uma resposta ao exacerbado sentimentalismo fantasista romântico – “o Romantismo é a apoteose do sentimento; o Realismo é a anatomia do carácter, é a crítica do Homem”, escreveu Eça de Queiroz. O Romantismo fora idealista e medievalesco, enquanto o Realismo era fatalista quanto ao presente.

Privilegiava-se a representação crítica de motivos sociais, servindo-se de imagens rurais, de cenas alusivas ao quotidiano urbano ou campestre da classe trabalhadora, e de retratos e auto-retratos.

Esta pintura liga-se profundamente a conflitos sociais, como a reinvidicação do proletariado de melhores condições de vida, a afirmação socialista e crises económicas; representando-se labores de personagens comuns, anónimos.

Recuperam-se técnicas clássicas rigorosas de perspectiva, volumetria, gradação de tons, tratamento luminoso e de texturação, e representação anatómica metódica.

Courbet é o iniciador e grande teorizador do Realismo Pictórico. De convicções socialistas, este foi apologista de se pintar o sensível e tangível, defendendo a primazia da observação directa natural em detrimento do sonho e fantasia, afirmando “não posso pintar um anjo porque nunca vi nenhum”. Outros realistas foram Leibl e Fattori, Daumier e Millet. Deste último é a autoria da obra “As Respigadoras do Trigo“, talvez a obra mais emblemática do movimento. Esta compõe-se de uma cena do quotidiano rural, com protagonistas anónimas de rostos virados, que funcionam como símbolos do colectivo. É uma visão objectiva e rigorosa da realidade (camponesas trabalhando no seio da Natureza austera, humildes e resignadas) – uma obra ideológica, de convicções socialistas, alertando para a classe trabalhadora com autenticidade em detrimento de sentimentalismo. Trata-se de uma composição equilibrada, com as principais figuras em primeiro plano e dotadas de bom tratamento volumétrico (reunindo, assim, as características técnico-formais e conceptuais que caracterizam o movimento).

Impressionismo

Esta tendência artística europeia (acima de tudo, parisiense) do final do século XIX propõe-se a criar pintura mais intuitiva e espôntanea, visando captar a realidade sensorial, explorando fenómenos luminosos e atmosferas cambiantes naturais – isto devido à atitude positivista que progressivamente se afirmava, por que se prefere os sentidos aos sentimentos, e devido à afirmação da Fotografia como meio técnico de representação rigorosa, que desafia a pintura a procurar novas expressões que escapam ao registo somente naturalista.

Encontra as suas principais influências em Turner, em Courbet, na Escola de Barbizon e na estamparia japonesa (esta caracterizada por uma concepção livre da forma e da perspectiva, linear, de cores claras e puras, e de temáticas populares).

Este movimento reprovava veementemente a arte académica e o trabalho em estúdio. A pintura impressionista exclui preparações prévias e aperfeiçoamentos finais. A tinta preparada previamente e disponível em tubos de zinco portáteis garantiu aos artistas mobilidade, permitindo que trabalhassem em locais naturais.

Descobertas científicas no domínio do comportamento da luz e da cor (como as levadas a cabo por Newton ou Young ou Chevreul) permitem que se enuncie a Teoria da Cor, de que partem noções rigorosas de como se operam contrastes cromáticos – conhecimento basilar para os artistas impressionistas. Os trabalhos impressionistas dão grande ênfase à luz, e são as cores que constroem as formas, em pinceladas rápidas e curtas, justapostas em função da síntese aditiva de cores complementares, que criavam assim a gradação tonal. Disto resultava o aspecto inacabado e rugoso dos quadros, com cores muito fortes e volumetria pouco definida, para captar a essência em detrimento do detalhe

Os temas, que não passam de pretextos para exploração de potencialidades luminosas, giram em torno da vida quotidiana burguesa, desde as festas aos demais convívios, no campo ou na cidade.

Manet é o grande precursor deste movimento, que se afirma com o trabalho de Monet, Renoir, Pissarro e Degas. É de “Impression Soleil Levant”, por Monet, que o movimento recebe o seu nome, e, no fundo, é precisamente esse o seu objectivo: impressionar; representar as impressões imediatas do artista ante uma variação de luz, um qualquer evento, sempre num estudo fugaz.

O Cinema Mudo III

O Cinema, nesta fase inicial de afirmação, regia-se por regras para o harmonizar ante o público genérico. Este paradigma passava por não deixar a acção da cena ser interrompida por um corte no plano ou pela saída do enquadramento; a direcção dos actores era sempre a da câmara, e o seu movimento horizontal a esta; as acções no segundo plano eram lentas e exageradas, e as interpretações no primeiro plano eram exacerbadas, para provocar plena compreensão das intenções projectadas.

Desde cedo, na indústria, os produtores lançaram-se também no controlo das exibições. Numa direcção capitalista, o desenvolvimento do Cinema dá mais relevo à exibição que à produção. Este sistema levou a os produtores dominarem completamente a realização do filme, também. Estes perpetuavam arquétipos das histórias, impunham as estrelas intérpretes e controlavam a edição, limitando a capacidade criadora dos realizadores. Isto prolongou-se até ao fim progressivo da primeira geração dos homens do Cinema.

Um outro dos géneros que se impôs do começo do Cinema foi o “serial”, de inspiração policial, aventureiro, um filme de narrativa com duração e extensão diferentes do habitual. Caracterizava-se pela sua dimensão, que causava grande impacto no público. Era um filme onírico/fantástico, repleto de vedetas, projectado para chegar à maior audiência possível. Este foi mais um dos artifícios com que se procurou deslumbrar, seduzir, atrair público para a Arte.

O Cinema Mudo II

A máquina do estrelato nasce da crescente concorrência entre as primeiras firmas, que garante o seu círculo de estrelas cinematográficas como chamariz para potencial público e, logo, fonte lucrativa. A estrela torna-se propriedade do estúdio, que rege a sua vida pública e privada, promovendo-a mediante lucros de bilheteira e atenção do público.

É em 1913 que se constitui Hollywood, uma grande concentração de estúdios nos arredores de Los Angeles.

Os géneros começam-se a demarcar, começando pelo “slapstick”, o cómico, inspirado no burlesco, na opereta, no circo; um género variado e fantasista, humorístico.

Detentora de uma enorme riqueza, a sociedade americana do início do século XX promovia o seu estilo de vida marcado pelo capitalismo, pela produção em massa, pela estimulada venda agressiva – um abuso dos bens, um elogio ao desperdício que caracterizou, por exemplo, as comédias de Sennett.

Os filmes americanos sempre foram feitos visando o entretenimento, e foram usados para promover o “sonho americano”, a novidade tecnológica invadindo o dia-a-dia, o conforto.

O Cinema Mudo I

Da Europa, a Câmara emigrou para a América, e lá se descobriram as grandes expressões artísticas próprias do Cinema. Na América, o Cinema torna-se na Arte capitalista, na medida em que a sua criação requeria recursos que só grandes detentores de capital disponibilizavam, fazendo-o na forma de um investimento do qual esperavam geração de lucro. Tornou-se assim, rapidamente, numa expressão dominada pela aristocracia, que a usava como novo modelo de projecção social.

O Cinema, inicialmente, ligou-se às formas de entretenimento de palco, do drama ao burlesco, explorando também outros espectáculos, como desportos. “The Monroe Doctrine” foi a primeira fita a ser exibida publicamente nos Estados Unidos da América, a 1896, compondo-se como um programa de compilação de pequenos filmes. Contudo, só em 1902 o Cinema seria tomado como um espectáculo próprio, e projectado em salas preparadas, e esta inovadora exibição cinematográfica foi montada por Thomas Tally.

Todo o Cinema se impôs lentamente, demorando-se a criar espaços específicos para projecções, ou mesmo técnicos qualificados – nos primórdios do cinema, os parcos recursos forçavam os poucos especializados a assumirem várias funções. Entre os grandes pioneiros, constam Porter, Blackton e Bitzer, ainda que o maior vanguardista técnico e artístico do Cinema seja Méliès.

O Cinema adquiriu, progressivamente, um papel predominante na sociedade. Como espelho da conduta social, era factor de integração para imigrados. Na projecção de actualidades coevas, o cinema tornou-se grande fonte de informação (agora um precioso registo histórico). E, na promoção de ideologias ou partidos políticos, tornou-se propaganda e assumiu uma função paramilitar. Devido ao fraco sentido crítico da massa, o Cinema adquiriu um grande poder persuasivo. Um reflexo da realidade e das preocupações sociais, o Cinema alerta às problemáticas, informando e estimulando o público.

Arquitectura Romântica

O Academismo Clássico é rejeitado, em prol de novas convicções de irregulariade volumétrica, efeitos luminosos, planos imbuídos de movimento e decoração pitoresca. A Arquitectura Romântica, em vez de domar a Natureza, vai-se mesclar nela, fundindo-se harmoniosamente, imitando-a, buscando nela inspiração e medida – agora, torna-se notória a preocupação com a inserção do edifício no meio envolvente.

A sua estruturação é irregular e variada, e a tendência decorativa é para a grande atenção aos pormenores, usando-se ferro e tijolo vidrado, os novos materiais industriais.

Revivalismo eclético e exótico – é como pode ser chamado o modo como a arquitectura romântica floresceu; reunindo inspiração nos estilos arquitectónicos passados de cada nação europeia, e fundindo-os entre si e com os de civilizações exóticas, da Ásia ou África. Reinventam-se os estilos bizantino, mourisco, indiano, românico, gótico, renascentista, barroco, com a adição das novas influências modernas e da mística que cada autor imprimia aos seus projectos.

Em Portugal, a arquitectura oitocentista inspira-se no românico, gótico, manuelino, mourisco e oriental. Desde o Palácio da Pena, à Estação Ferroviária do Rossio, à Praça de Touros do Campo Pequeno, ao Palácio do Buçaco, ou ainda (tardo-romântica) a Basílica de Santa Luzia

Gustave Eiffel e a 1ª Exposição Universal

O engenheiro Gustave Eiffel (1832-1923) representa o exponente máximo da ruptura tecnológica e científica na Europa do século XIX. Suas obras incluem os projectos da Torre Eiffel, da Estátua da Liberdade e das comportas do Canal do Panamá, de carácter pioneiro e emblemático.

Herdeiro do espírito inventivo da Revolução Industrial, quando a Arquitectura é do primado dos engenheiros, responde às novas questões postas pela novidade com soluções pragmáticas e estetas – a simbiose entre a funcionalidade e a nova estética. O engenheiro substitui o arquitecto por ter uma formação tecnicamente mais adequada aos novos meios de construção, além da sua sensibilidade pragmática.

A generalização do uso do ferro e do vidro possibilita o surgir de novas respostas para plataformas de transportes ou para estruturas de edifícios. E, detendo Inglaterra uma poderosa indústria siderúrgica, vai mais rapidamente adoptar estes novos paradigmas de construção.

As exposições universais, começadas na segunda metade do século XIX, surgiram como fruto da necessidade de divulgar e partilhar novas informações, produtos e tecnologias da Revolução Industrial. A primeira, realizada em Londres, a 1851, teve lugar no “Palácio de Cristal”, grande êxito funcional e estético, executado rapida e economicamente, vindo a marcar a grande ruptura com os conceitos arquitectónicos clássicos como grande paradigma do edifício moderno, inspirando imitações por todo o mundo. As exposições universais personificavam a apologia da maquinaria e tecnologia sobre a tradição.

Os engenheiros afirmaram, com o Palácio de Cristal, a sua nova apologia à modernização das edificações, aos materiais industriais (ferro e vidro), à estruturação orgânica sobre as paredes, aos espaços translúcidos.