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Idealismo e Realismo

A possibilidade do conhecimento prende-se com os limites do cognoscível. Isto liga-se à noção da percepção, o processo activo pelo qual se interpreta sensações dos sentidos, implicando-se uma actividade cognitiva para além da mera recepção de estímulos, mas até a uma apreensão subjectiva destes, conferindo-lhes significado. Das percepções, surgem depois os conhecimentos. Mas em que medida é que estes são fiéis à imagem real que receberam?

Desde os primeiros filósofos que se questiona a natureza do conhecimento quanto à sua aproximação à realidade. Numa atitude céptica, achou-se que as ilusões a que estava sujeito quem tentasse entender a realidade bastava para que qualquer tentativa de entendê-la era fútil. Este cepticismo epistemológico estabeleceu as figuras do sujeito cognoscente e dos objectos cognoscíveis. Este cepticismo é uma teoria presa à (inexistência de) segurança na percepção da realidade, preocupando-se com o entendimento desta o mais aproximado possível – é, portanto, uma teoria realista.

Contudo, o Realismo de Senso Comum, ou Ingénuo, é contra o cepticismo, aceitando a realidade como é percepcionada pelos sentidos, directa e não mediatizadamente. Os objectos físicos são como parecem ser, pois os órgãos sensoriais são em geral fidedignos, apreciando o mundo realisticamente, e qualidades como sabor, cor ou som pertencem ao próprio objecto.

O cepticismo é contra este testemunho dos sentidos, que acha ilusório, distado da realidade.

Outra resposta à possibilidade do conhecimento é o Idealismo. Este defende que o que se conhece é uma experiência, mas encerrada na mente, e dependente da sua interpretação – sustenta que os dados sensíveis são elemento básico da experiência humana e essa experiência é de representações mentais, e não do próprio mundo, que não existirá verdadeiramente. Para o idealista, os limites do conhecimento são o próprio conhecimento.

O idealismo pode conduzir ao solipsismo, pelo qual tudo quanto existe é uma fabricação da mente. Esta posição é desconcertante na medida em que por natureza o Homem se projecta para fora de si, presumindo a existência do exterior. E sentimentos como vergonha ou embaraço não fariam sentido numa concepção solipsista, pois uma única mente não iria julgar-se a si própria negativamente para despontar essas emoções.

Os cépticos dizem abertamente que não podemos conhecer nada, os realistas ingénuos que podemos conhecer quanto somente experimentarmos, e os idealistas que somente o que está na nossa mente.

No fundo, a posição céptica parece simplista, mas não deixa de parecer ter alguma validade. Todavia, simplesmente, o céptico, sendo-o, sabe demais – sabe que o cepticismo é a única verdade, quando não devia saber de nada. Também, podendo nos enganarmos constantemente não implica necessariamente não sermos capazes de reconhecer a verdade, como podemos sempre mentir e ser capazes de dizer a verdade.


Perspectiva sobre a Gnoseologia

Conhecer o Conhecimento é a premissa da obra de Edgar Morin, “O Conhecimento do Conhecimento”. Esta obra é iniciada com uma citação de Schiller: “No abismo reside a Verdade”.

Entenda-se o Conhecimento do Conhecimento como um “meta-conhecimento“, como a Gramática será uma “meta-linguagem“. Sobre esta matéria reclina-se a Gnoseologia, quando a Epistemologia abarca a reflexão sobre o conhecimento científico, a Antropologia sobre o conhecimento sócio-cultural, as Ciências Bio-Químicas e a Sociologia do Conhecimento

Segundo Morin, podemos comer sem saber leis da digestão, respirar sem saber leis da respiração, pensar sem saber leis do pensamento, e conhecer sem conhecer o conhecimento. “O erro não consiste senão e, que não parece ser tal”, Descartes. Karl Marx e Friedrich Engels começam “A Ideologia Alemã” dizendo que os homens sempre elaboraram falsas concepções de si mesmos, dauqilo que fazem, daquilo que devem fazer e do mundo em que vivem. Assim, quando o pensamento descobre o problema dos erros e das ilusões e o seu risco permanente, deve procurar é conhecer-se. Foi a intelligentsia (elite cultural) que, no século XX, fez o Mito tomar forma de Razão, camuflando ideologia com ciência, Doxa com Episteme – Morin refere-se, portanto, ao Messianismo e ao Niilismo que se degladeiam pelo controlo político.

Os avanços recentes da ciência, da física, aproximam-nos antes mais e mais do desconhecido, para que são precisas novas construções conceptuais que nos põem o problema do incognoscível – a nossa razão aproxima-se de um domínio inexplorado, um limite? Será a Razão universal, como se a julgava? Começámos a descobrir que ignorávamos, destruíamos, desprezávamos tesouros de conhecimento precisamente na demanda contra a ignorância. Há uma necessidade absoluta de reflectir e reinterrogar o conhecimento, alcançar as contradições, possibilidades e chegar mais perto da verdade, chegando da resposta à pergunta prévia, à maneira do pensamento ocidental, que transforma a verdade na interrogação – contudo, será necessário abandonar esta noção de verdade por outra? Será que existe alguma sequer?

A noção de “conhecido” parece evidente, mas quando verdadeiramente interrogada, esta ramifica-se em miríades de possibilidades: o saber, a informação, a percepção, a representação, a explicação, a compreensão, a conceptualização, o juízo, a causalidade, a análise, a indução, a dedução, o inato e o nato, o cálculo e a cognição, opiniões e crenças, consciência e lucidez, clarividência, inteligência, ideia, teoria, pensamento, verdade ou erro, fé, dúvida, intuição, razão, ciência, filosofia, mito, poesia.

A noção de conhecimento, rapidamente, estilhaça-se em múltiplas ideias. Em profundidade, será o conhecimento uma reflexão das coisas (realismo), uma construção do espírito (idealismo)? No fundo, acabamos por encontrar a ignorância, a sombra, o desconhecido na noção de conhecimento – um paradoxo que nos surge quando tentamos conhecer o conhecimento.

Edgar Morin entende o Homem como uma unidade bio-psico-sócio-cultural, e entende o conhecimento como algo igualmente composto de constituintes heterogéneos indissociáveis. Bento Spinosa, racionalista português, entende o conhecimento em três níveis: o comum, do empirismo, vulgar; o científico, obtido numa aprendizagem e investigação institucionalizadas; e o filosófico, contemplativo, reflectivo.

Assim, o conhecimento não se pode reduzir nunca a uma única noção, seja “informação”; “percepção”, “ideia”, “descriminação”, “teoria”; o conhecimento deve ser compreendido como multidimensional, comportando a capacidade, a cognição e um resultado do todo.

Edgar Morin entende o conhecimento como composto por três elementos associados: A Competência, a aptidão para  produzir, entender conhecimento; A Actividade Cognitiva, o pensamento trabalhado; O Conhecimento propriamente dito, produto de um entendimento dum sujeito sobre um objecto de conhecimento. Estes elementos do conhecimentos ligam-se a três factores: Cérebro, aparelho bio-físico-químico, que necessita de uma Existência Biológica-Cultural do indivíduo e o suporte da própria Cultura, que aglutina a linguagem do indivíduo, a lógica que constrói, o todo o capital de saberes conjuntos e critérios de Verdade, a História Civilizacional e Humana.